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Uma actriz muito jovem observa uma grande actriz. Admira-a. No camarim, imita gestos, tempos. Estuda-a.

Ela é a Emília das Neves.
Ela é a Palmira Bastos.
A Amélia Rey-Colaço.
(A grande actriz vai mudando de nome conforme quem conta.)
É uma. grande. actriz.

A jovem actriz ganha coragem e diz-lhe que a admira, que é um privilégio estar ali.
A grande actriz: Trabalha aqui no teatro?
A pequena actriz, constrangida, explica que contracena com ela.
A grande actriz olha para ela. Diz: Ai sim? Hei-de reparar.

O teatro português parece-me sempre profundamente desinteressante. Hei-de reparar. é um projecto de pesquisa teatral sobre teatro, e que parte de vidas e obras de actrizes portuguesas do século XIX e XX para pensar no que é o teatro português – hoje e antes. Foi sempre tão mau como parece ter sido? A coisa mais teatral que encontro no teatro português são as histórias das actrizes.

Em ensaios, ouvimos muto frequentemente, como se fosse um defeito, isso é muito teatral, muito teatro, muito teatrão. Rimo-nos da intensidade, de tiques, de cadências aprendidas, de egomania, de canastrice. O teatro precisa de ser contemporâneo, ter bom gosto, ser minimal. Cool.

Talvez este projecto queira ser muito teatral. Canastrão. Procurar nos códigos e mitologias do teatro uma forma de questionar o teatro que fizemos até hoje, e o teatro que fazemos ainda agora. Hei-de reparar. é um divertimento. Uma visita às histórias e aos mitos, às técnicas, às falhas: à imagem da Grande Actriz que permanece e se apaga; às imagens que a história deixa desaparecer, e às imagens que a história vai escolhendo.

Ficha Artística / Técnica

Direcção artística e Texto
Raquel S.

Interpretação e Co-criação
Maria Jorge

Direcção de Produção
Inês Maia | Pé de Cabra

Cenografia e figurinos
Pedro Azevedo

Música
Odete

Imagem e Comunicação
Nuno Matos

Um espectáculo
Noitarder - Associação Cultural

Co-produzido por
Braga 25 Capital Portuguesa da Cultura

Projeto financiado por
República Portuguesa e Direção Geral das Artes

Residência artística na Mina de S. Domingos apoiada pela Companhia Cêpa Torta
Residências artísticas O Espaço do Tempo e CAMPUS - Paulo Cunha e Silva

© Guedes

Raquel S. (Monção, 1986) é encenadora e dramaturga e trabalha a partir do Porto. Fundou a Noitarder em 2018, onde desenvolve projectos que cruzam teatro, literatura e filosofia, tais como Longe (2018), amor.demónio (2021), Ruído (2021), Cadernos de (2022) e DESCANSAR (2023). Foi uma das dramaturgas seleccionadas par a École des Maîtres 2020, onde escreveu e apresentou CARNE. Escreve e dirige outros artistas e companhias, escreve ensaios e outros textos e dá aulas de dramaturgia.

Raquel S. / Noitarder

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