Falar de Mercedes Mais Eu implica inevitavelmente falar de desejo. Esse desejo que encontra razões para se projetar para além de um primeiro encontro, para se tornar reencontro, conversa, experiência, afeto... Persistir nesse desejo, que se atualiza ao atravessar o projeto, é sublinhar o que nos acontece em cada encontro. Mas é também aprofundar o que é nosso e o que é partilhado, para além do sujeito e do território. Ou, pelo menos, para além desse território escrito com maiúscula, hegemónico, que se impõe e nos constrói de fora para dentro, definindo os nossos limites através de formas e padrões que nada têm a ver com herança ou memória. Essa memória ou arquivo vivo que se atualiza com o desejo, afastando-nos da nossa própria imanência.
Mercedes Mais Eu é uma colaboração entre a artista Janet Novás e a compositora Mercedes Peón, na qual ambas exploram a relação particular que existe e se estabelece entre a dança e a sua música. Entre instrumentos, memórias, cantos e danças, emergem conceitos em diferentes estados de latência. Alguns, com forte conteúdo sociopolítico, estão presentes, desde objetos musicais, a coreográficos, e biográficos; outros, de natureza somática ou experiências quânticas, surgem nos pulsos, nos ritmos e nos tons, nas vozes e nas dinâmicas, nos silêncios, nas formas.
A obra, no feminino, é um híbrido entre música e dança, repleto de imagens evocativas. Está dividida em quatro secções, permitindo-lhe habitar diferentes arquiteturas ou enquadramentos, do mais teatral ao instalativo e museológico.