Vado e non torno é um projeto que pretende testar as fronteiras disciplinares e dos meios performáticos, a partir da apropriação e transposição de conceitos associados à glitch art que explora o erro e a realidade ficcionada, com a intenção de compreender e representar o “tempo real”.
Com direção artística e performance de Óscar Silva e Mauricio P. Castro, também na dramaturgia, pretende concretizar-se unicamente no plano real, implicando o corpo do outro que cocria e observa simultaneamente. Em Vado e non torno, Maurício P. Castro parte do capítulo 6 de Ulysses, de James Joyce, para levar o performer solitário (Óscar Silva) e o público numa jornada introspetiva e irónica sobre a morte e o além. No espaço sombrio a que poderemos chamar palco, somos levados a testemunhar as tentativas – quase sempre falhadas ⎯ do ator a tentar emergir das sombras para proclamar a grandiosidade do momento performativo.
Em oposição à criação artística como uma unidade coesa e com totalidade de sentido, em Vado e non torno, centrada na presença do outro, quem faz e quem vê, explora-se a consciência extrema do evento artístico como acontecimentos impuros. Investe-se na margem de risco e de imprevisibilidade, não como uma obsolescência descartável, mas enquanto metodologia crítica. Aliada à narrativa da viagem obscura de Bloom em Joyce, o performer conduz-nos pelas profundezas de um submundo, revelando a história de um explorador em Polcenigo, Itália, e suas experiências amorosas e existenciais em lugares como Gorgaz e Orrido di Val Celina. A encenação procura sempre desafiar os limites do tempo e da percepção humana, convidando o público a confrontar a efemeridade da vida e a eternidade da morte. O conflito vive assim da presença física do público que é desafiada e redefinida, à medida que o espetáculo questiona as noções convencionais de realidade e mortalidade, revelando o “Inferno” como uma metáfora do tempo medido em segundos e milénios.
Neste mergulho existencial, o espetáculo transcende as fronteiras da narrativa teatral tradicional, forçando o público a confrontar sua própria mortalidade e a explorar os mistérios do além.
Este espetáculo é dedicado a Sylvia Soares.